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quarta-feira, agosto 08, 2007

O dia estava calmo, não se previa chuva e não estava demasiado calor. O destino não era importante, mas o desejo de ver o mar era grande! À minha espera estava a deslumbrante (FSRH) Harley-Davidson Road King que podem ver nas fotos. Sentar-me em tal tipo de máquina exige sempre de mim um momento de reflexão. Ter que esquecer a posição de condução “normal” de quem anda de moto, e colocar as mãos ao alto em vez de as pôr em baixo e os pés para a frente em vez de para trás, é sempre registado cá dentro como uma excepção e não como uma regra (pelo menos por enquanto). Mas a verdade é que esta Road King, deu-me imenso prazer! Transeuntes curiosos e amigos contemplaram-na sempre emitindo a sua opinião, quer baseada no que viram, quer bastante influenciados pelo “status” da marca. Mas todos foram unânimes: É muito bonita! Distinta! Uma grande moto! Deve ser muito confortável, etc.


 Pois bem, sem chave, que isso é coisa de antigamente (agora a Road King trás um porta-chaves com RFID - identificação por rádio frequência), o novo sistema poupa-nos aquelas cenas macacas de ter que descalçar a luva recém posta, para tirar a chave muitas vezes esquecida no bolso! Assim, a chave serve apenas para imobilizar o botão de contacto e trancar a direcção. Ao afastarmo-nos, o alarme é activado, o imobilizador é accionado e, ao voltarmos a aproximarmo-nos os mesmos são desligados. Em pequenas paragens, basta rodar o grande botão do contacto, para desligar o motor, e mais nada! Maravilha! Vamos lá embora, então! O momento de dar arranque nesta moto é sempre uma celebração! Desde que nos habituemos a algumas pancadas fortes dos pistões logo no momento do arranque, somos imediatamente saudados por uma sucessão de explosões (no caso disfarçadas demais pelos longos escapes (street legal) que se nos entranham e deixam antever quilómetros de prazer. Com um descomunal “clanque” vindo da caixa de velocidades e que nos avisa que a primeira velocidade está engrenada, estamos prontos para arrancar! E que arranque! Basta largar a embraiagem e tirar os pés do chão! Parece que foi ensinada a andar! Podem até levar uma cesta de ovos no lugar do pendura pois o mote desta moto parece ter sido a suavidade! O grande binário disponibilizado (mais de 12 Kg/m às 3.400 rpm) pelo motor de 96 CI (1.573 cc.) dispensa grandes acelerações e, praticamente ao “ralenti”, podemos largar a embraiagem à confiança que lá vamos nós!


A manobrabilidade desta máquina, entre os carros, no estacionamento, a sair da garagem ou em ruas apertadas é grande, mas apenas em termos relativos. Os seus 330 Kgs de peso a seco, e os quase 2,40 mts de comprimento mais a largura de quase duas motos “normais”, é obra. Muita obra! Basta que disso nos esqueçamos e garantidamente vamos dar connosco a pedir ajuda para a puxar para trás! Ainda assim, das “grandes custom” que conheço, este enorme pedaço de vaidade é uma das mais manobráveis, ao contrário do que podia parecer. Contribui para isso a modesta inclinação da forquilha com apenas 26º e um centro de gravidade extremamente baixo, receita para não termos medo de a deixar cair. O pneu traseiro estreito, (de medida específica Harley mas que equivale aproximadamente a um 140 na medida normal) é também responsável pela facilidade com que esta Road King entra em curva e se mantém estável mesmo a baixa velocidade. O guiador bem aberto e não demasiado alto também contribui para o aumento da confiança pois, ao manobrar, temos algo onde agarrar firme. A vibração “típica” que se sente ao ralenti rapidamente desaparece em andamento.



O novo motor de 96ci representa um grande avanço relativamente aos modelos anteriores, proporcionando uma enorme sensação de potência e de suavidade agradando aos mais puristas e aos mais desconfiados. Depois de engrenar a 5ª ou a 6ª velocidade, e sem ser preciso grandes subidas de rotação, a Road King mostra-nos tudo o que basicamente é: uma moto para desfrutar a paisagem e a companhia, seja qual for o trajecto, seja qual for o tempo, ou o destino. Desde que não se pretenda fazer uma condução muito “empenhada” dispomos de um sofá super confortável, uma posição do condutor e pendura perfeitas para aguentar sem problemas horas seguidas de viagem. E se tivermos que cumprir médias, bom, vão ter uma grande surpresa. Com esta máquina, conseguem-se muito boas médias de tempo. Boas demais até talvez! Para isso contribui a suspensão relativamente macia, que pode ser afinada de acordo com o nosso gosto, na estação de serviço, aumentando ou diminuindo a pressão de ar da pré-carga dos amortecedores. E, se a nossa estrada não for muito movimentada, podemos ainda dar-nos ao luxo de ligar o “cruise-control” e deixar a imaginação correr… Os travões estão bem dimensionados. Pelos percursos que fiz ao longo das nossas nacionais, nunca lhes detectei qualquer fadiga, mesmo a descer estradas sinuosas e com pendura. A sua eficácia também não tem qualquer reparo. O grande pára-brisas protege-nos da bicharada, da intempérie, e o único preço a pagar é um pouco de vibração no capacete.

 A iluminação é óptima. Contribuindo para isso o grande farol equipado com lâmpada de halogéneo/quartzo de 60W e os seus dois satélites de 35W cada, e que podem ser desligados manual e individualmente. A autonomia do depósito de 18 litros cifra-se nos 250 km para um andamento que, digamos, quase corresponde ao cumprimento do código da estrada, aplicando-lhe apenas todas as desculpas que normalmente inventamos quando vamos com pressa! (Sem exageros claro!) E sem nunca nos privarmos de fazer “bombar”, ainda que discretamente, aqueles escapes sempre que chegamos ou partimos de algum local.


 Ficha Técnica: Motor Tipo: 4T, 2 cilindros em V, arrefecido a Ar Distribuição: - Cilindrada: 1584cc Diâmetro x curso: 95,3x111.1 Potência declarada: - Binário declarado: 12.9 kgm/3500rpm Ignição: - Alimentação: ESPFI- Electrónica sequencial Racio de compressão: 9,2:1 Arranque: eléctrico Embraiagem: - Caixa: seis velocidades Transmissão secundária: por correia Ciclística Quadro: Em aço tubular Suspensão dianteira: Forquilha convencional Suspensão traseira: Dois amortecedores com pré carga ajustável por ar comprimido Travão dianteiro: Dois discos de 320mm com pinça de dois pistões Travão traseiro: Disco de 320mm com pinça de dois pistões Roda dianteira: MT90B16 72H Roda traseira: MU85B16 77H Dimensões Comprimento: 2380mm Distância entre eixos: 1610mm Altura do assento: 683,3mm Capacidade do depósito: 22,7l Peso: 332kg Preço: -

sábado, junho 23, 2007

25 Concentração de Faro








Antes da partida é o stress: marcar a revisão da moto, ou nem que seja apenas pôr só a mudar o óleo! E o pneu? O pneu ainda dá!

Combinar com o resto do pessoal qual o ponto de encontro. Preparar a mochila. Pedir a tenda emprestada… e ir buscá-la! Despachar os últimos e-mails e faxes. Acabar aquilo que o chefe pediu…

A excitação acaba muitas vezes por antecipar a partida e há quem saia a meio da noite em vez de dormir e partir de manhã cedo, já descansado! Mas há que chegar lá. E quanto mais cedo melhor, já que o regresso está marcado e com data certa! Para muitos foi um ano de espera! Para outros foram dois ou três que a vida nem sempre corre como queremos! Metidos ao caminho, resolve-se o dilema de ir pela AE ou pela nacional. Mais curvas ou mais depressa? Talvez o mais barato! Sempre são bastantes euros de portagem! Dá quase para a gasolina toda!

Mas ainda antes de nos podermos deixar absorver pelo momento da chegada, aparece o patrulhamento! As barragens de estrada premeditadas pelas autoridades, que nos fazem momentaneamente regressar à realidade e maldades do mundo, reduzindo-nos ao nível de substantivo colectivo. Somos confrontados com as metralhadoras apontadas pelas forças de segurança e eventual repressão, que tentam ingloriamente e à bruta, combater a falta de educação que não se proporciona nem nas famílias nem nas escolas de alguns, à custa da dignidade da maioria. Afinal não passou de mais uma história para contar.

Mas com essa imagem no inconsciente, e talvez por isso com a convicção reforçada, chegamos então a um mundo aparte, onde parece que nada mais importa a não ser o divertimento e o esquecimento completo das amarguras da vida, das responsabilidades e dos preconceitos. Felizes apenas por termos chegado! À entrada de Faro começa-se imediatamente a respirar mais profundamente aquele ambiente que já íamos adivinhando na viagem: Calor, motos, descontracção, diversão, convívio, encontros, reencontros.

Um ambiente saudado por uns, invejado por outros, coordenado por uns muitos quantos, na maioria anónimos, que dão o seu melhor para fazerem com que os visitantes gostem e tenham vontade de voltar. Já é uma questão de orgulho! E somos impelidos a integrarmo-nos no ambiente.

Aparecem os amigos, os conhecidos, os que nunca vimos mas que prenderam a nossa atenção, e falamos com eles, ou eles falam connosco, seja em francês, em italiano, em inglês ou espanhol, sobre qualquer coisa, sem pretextos, apenas ou quase trivialidades, expressões de alegria e contentamento, ou com as línguas mais ou menos entarameladas por óbvios excessos de cerveja ou de qualquer outra coisa que tenha o poder de produzir uma alteração de cor na humanidade, na realidade, alguma coisa que promova a magia da descontracção, ofusque os problemas e liberte os sentimentos. Pois de sentimentos libertos, vagueia-se melhor de um lado para o outro à procura de mais coisas, de mais amigos, mais espectáculos, mais prendas para a família e/ou mais-que-tudo que ficaram em casa. E também há que procurar algum local onde matar a sede ou a fome, pois o ar dos pinheiros e as caminhadas abrem o apetite!

Muitos montam tenda no recinto. Muitos mesmo! Afinal há boas condições! Uns chegam e ficam, quietos, com a moto arrumada, a festa é ali! Outros ambicionam ver tudo, dentro e fora, a festa é por aí! Há quem prefira os hotéis ou casas da região, e alguns desses nem chegam sequer a entrar no recinto; Limitam-se a ficar de fora a ver quem passa, como passa ou nem isso! Daí o corrupio entre o recinto e a Ilha de Faro, ou a cidade. Ou a caminho de qualquer outro ponto de encontro pré-combinado, ou apenas em passeio. Há que ir buscar namoradas, ou namorados, buscar mantimentos, trazer amigos ou amigas que estão perdidos ou ainda no caminho com algum problema.

E ainda há os almoços e os jantares de convívio em restaurantes da zona. São literalmente milhares de pessoas e motos, permanentemente em movimento, qual formigas, e que proporcionam aquele frenesim que acaba por marcar o ritmo dos acontecimentos, e os picos de tráfego da rede de telemóveis!

Não há descanso para a organização. Há que receber, acompanhar, abastecer, limpar, alimentar e distrair ou entreter, conforme o caso! Os eventos sucedem-se. Música, concursos, passatempos, acrobacias, dança, ritmo cor e corpos. Com elencos mais ou menos vestidos, mais ou menos talentosos.

Durante o dia e durante a noite. Todo o dia e toda a noite! Para todos os gostos e todas as idades. Por vezes a maioria da assistência já nem liga, alguns ficam inanimados em frente aos palcos, a desfrutar ou a pensar. Com o copo numa mão e o bolso na outra, por vezes tentando fazer contas às moedas e às senhas da cerveja… Será que dá? Outras vezes apenas tentando ganhar coragem para alguma abordagem mais matreira ou brejeira… Será que dá? Uns absorvem tudo como se disso dependesse a sua felicidade. E dançam, e pulam, e cantam! E quase entram em êxtase. Outros não estão nessa, ou porque procuram companhia específica, ou porque lhes falta a companhia que queriam ter! Ainda há os que estão na tenda! Descansando, ou porque tiveram sorte! Fosse porque arranjaram uma grande ressaca, ou uma grande companhia! Ou até as duas, já que o álcool é o tratamento de beleza que Deus proporcionou às mulheres feias!

E há motos! Motos de todas as cores, formatos, estilos e estados. Há motos por todo o lado! No meio das tendas, ao lado dos palcos, em exposições, em stands, até no meio dos balneários. São MONOs, BIs, TRIs, TETRAs, HEXAs, flats, em “V” ou em “linha”, com motores de capacidades que vão desde o meio quartilho ou menos, até à embalagem familiar. Há as remediadas e as opulentas, as modestas e as faustosas, as discretas e as excêntricas. Há-as para todos os gostos, idades, tamanhos e propósitos. Há motos para concurso, motos para transporte, motos para dar nas vistas. Baratas e caras, limpas e sujas. Há de tudo. Há de todos! É impossível descrever ou explicar o que é Faro!