sábado, junho 23, 2007
25 Concentração de Faro
Antes da partida é o stress: marcar a revisão da moto, ou nem que seja apenas pôr só a mudar o óleo! E o pneu? O pneu ainda dá!
Combinar com o resto do pessoal qual o ponto de encontro. Preparar a mochila. Pedir a tenda emprestada… e ir buscá-la! Despachar os últimos e-mails e faxes. Acabar aquilo que o chefe pediu…
A excitação acaba muitas vezes por antecipar a partida e há quem saia a meio da noite em vez de dormir e partir de manhã cedo, já descansado! Mas há que chegar lá. E quanto mais cedo melhor, já que o regresso está marcado e com data certa! Para muitos foi um ano de espera! Para outros foram dois ou três que a vida nem sempre corre como queremos! Metidos ao caminho, resolve-se o dilema de ir pela AE ou pela nacional. Mais curvas ou mais depressa? Talvez o mais barato! Sempre são bastantes euros de portagem! Dá quase para a gasolina toda!
Mas ainda antes de nos podermos deixar absorver pelo momento da chegada, aparece o patrulhamento! As barragens de estrada premeditadas pelas autoridades, que nos fazem momentaneamente regressar à realidade e maldades do mundo, reduzindo-nos ao nível de substantivo colectivo. Somos confrontados com as metralhadoras apontadas pelas forças de segurança e eventual repressão, que tentam ingloriamente e à bruta, combater a falta de educação que não se proporciona nem nas famílias nem nas escolas de alguns, à custa da dignidade da maioria. Afinal não passou de mais uma história para contar.
Mas com essa imagem no inconsciente, e talvez por isso com a convicção reforçada, chegamos então a um mundo aparte, onde parece que nada mais importa a não ser o divertimento e o esquecimento completo das amarguras da vida, das responsabilidades e dos preconceitos. Felizes apenas por termos chegado! À entrada de Faro começa-se imediatamente a respirar mais profundamente aquele ambiente que já íamos adivinhando na viagem: Calor, motos, descontracção, diversão, convívio, encontros, reencontros.
Um ambiente saudado por uns, invejado por outros, coordenado por uns muitos quantos, na maioria anónimos, que dão o seu melhor para fazerem com que os visitantes gostem e tenham vontade de voltar. Já é uma questão de orgulho! E somos impelidos a integrarmo-nos no ambiente.
Aparecem os amigos, os conhecidos, os que nunca vimos mas que prenderam a nossa atenção, e falamos com eles, ou eles falam connosco, seja em francês, em italiano, em inglês ou espanhol, sobre qualquer coisa, sem pretextos, apenas ou quase trivialidades, expressões de alegria e contentamento, ou com as línguas mais ou menos entarameladas por óbvios excessos de cerveja ou de qualquer outra coisa que tenha o poder de produzir uma alteração de cor na humanidade, na realidade, alguma coisa que promova a magia da descontracção, ofusque os problemas e liberte os sentimentos. Pois de sentimentos libertos, vagueia-se melhor de um lado para o outro à procura de mais coisas, de mais amigos, mais espectáculos, mais prendas para a família e/ou mais-que-tudo que ficaram em casa. E também há que procurar algum local onde matar a sede ou a fome, pois o ar dos pinheiros e as caminhadas abrem o apetite!
Muitos montam tenda no recinto. Muitos mesmo! Afinal há boas condições! Uns chegam e ficam, quietos, com a moto arrumada, a festa é ali! Outros ambicionam ver tudo, dentro e fora, a festa é por aí! Há quem prefira os hotéis ou casas da região, e alguns desses nem chegam sequer a entrar no recinto; Limitam-se a ficar de fora a ver quem passa, como passa ou nem isso! Daí o corrupio entre o recinto e a Ilha de Faro, ou a cidade. Ou a caminho de qualquer outro ponto de encontro pré-combinado, ou apenas em passeio. Há que ir buscar namoradas, ou namorados, buscar mantimentos, trazer amigos ou amigas que estão perdidos ou ainda no caminho com algum problema.
E ainda há os almoços e os jantares de convívio em restaurantes da zona. São literalmente milhares de pessoas e motos, permanentemente em movimento, qual formigas, e que proporcionam aquele frenesim que acaba por marcar o ritmo dos acontecimentos, e os picos de tráfego da rede de telemóveis!
Não há descanso para a organização. Há que receber, acompanhar, abastecer, limpar, alimentar e distrair ou entreter, conforme o caso! Os eventos sucedem-se. Música, concursos, passatempos, acrobacias, dança, ritmo cor e corpos. Com elencos mais ou menos vestidos, mais ou menos talentosos.
Durante o dia e durante a noite. Todo o dia e toda a noite! Para todos os gostos e todas as idades. Por vezes a maioria da assistência já nem liga, alguns ficam inanimados em frente aos palcos, a desfrutar ou a pensar. Com o copo numa mão e o bolso na outra, por vezes tentando fazer contas às moedas e às senhas da cerveja… Será que dá? Outras vezes apenas tentando ganhar coragem para alguma abordagem mais matreira ou brejeira… Será que dá? Uns absorvem tudo como se disso dependesse a sua felicidade. E dançam, e pulam, e cantam! E quase entram em êxtase. Outros não estão nessa, ou porque procuram companhia específica, ou porque lhes falta a companhia que queriam ter! Ainda há os que estão na tenda! Descansando, ou porque tiveram sorte! Fosse porque arranjaram uma grande ressaca, ou uma grande companhia! Ou até as duas, já que o álcool é o tratamento de beleza que Deus proporcionou às mulheres feias!
E há motos! Motos de todas as cores, formatos, estilos e estados. Há motos por todo o lado! No meio das tendas, ao lado dos palcos, em exposições, em stands, até no meio dos balneários. São MONOs, BIs, TRIs, TETRAs, HEXAs, flats, em “V” ou em “linha”, com motores de capacidades que vão desde o meio quartilho ou menos, até à embalagem familiar. Há as remediadas e as opulentas, as modestas e as faustosas, as discretas e as excêntricas. Há-as para todos os gostos, idades, tamanhos e propósitos. Há motos para concurso, motos para transporte, motos para dar nas vistas. Baratas e caras, limpas e sujas. Há de tudo. Há de todos! É impossível descrever ou explicar o que é Faro!
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